“Eu continuo a ser uma coisa só: um palhaço, o que me coloca num nível mais elevado do que o de qualquer político.” Charlie Chaplin

sábado, 10 de dezembro de 2011

Sem amor o mundo seria lindo

Por: Gilberto Bernardi Jr.


Falta realidade em tudo. Um sentimento de fácil comoção, de difícil aperfeiçoamento e com o lado positivo completamente esquizofrênico.



          É da natureza do ser humano nascer puro e desprovido de inteligência. Todo mundo cresce recebendo informações diversas e vai criando a própria visão de mundo. São acontecimentos gerados pela própria vida que colocam os humanos numa posição de defesa ou ataque, mas acima de tudo, todos criam uma estratégia e um conhecimento que resulta quase sempre num pensamento real de como as pessoas são. Claro que há a possibilidade de discernimento sobre fatos, entretanto, são os próprios fatos que resultam em idéias negativistas a respeito dos próprios seres humanos.
          O que falta para as crianças, por exemplo, é a realidade nua e crua desde os primórdios. A lógica de narrar contos de fadas e ensinar-lhes que há um mundo perfeito é a maior e mais cruel mentira contada pelos pais que, num momento de proteção, cometem a fraude e burlam o imaginário - o problema é a fantasia.
          Esse modernismo intuitivo vive a todo instante um colapso sentimental e digital e, a culpa, volta-se à indefinição do amor. O que move todos os acontecimentos mundiais é o amor. Até que as pessoas possuem um acordo de não envolver o sentimento, tudo caminha numa lógica incondicionalmente completa: guerras não acontecem, a ciência e a religião não entram em conflito, Deus fica calmo, o Diabo deixa até de nos tentar, o índice de suicídios diminui, menos alcoólatras, menos usuários de drogas, músicas com letras de qualidade e, claro, pessoas sem sofrimento.
          A prova de que o amor é um abuso contra o eu interior é um fato consumado. E por mais que possa doer para nós, a culpa provém dos nossos pais, que nos ensinaram a ter amor. Vejamos: nos ensinam a gostar do próximo, mas é gostando do próximo que levamos uma punhalada pelas costas; nos ensinam que todo o ser humano é humilde, mas a vida te mostra que humildade não existe; te contam que dinheiro não é tudo, mas se você não tem dinheiro na vida, você é um nada; te ensinam a gostar das pessoas, a dedicar-se a elas, a demonstrar sentimento, mas no momento que segue o ensinamento, a vida te mostra que a fantasia não existe e no mesmo momento ela te cospe na cara, te agride e o que é pior, te mostra o quanto você é um otário por acreditar em príncipes e princesas impregnados apenas em páginas de livrinhos abstratos.
          No mínimo acontece uma submissão contra o irreal e, é normal. Chega a ser um hábito ficarmos arrasados e nostálgico após a nossa taxa de otáriedade atingir o nível máximo. Por isso que nunca devemos nos doar às pessoas que supostamente amamos, pois são estas que vão te decepcionar na próxima cena da vida. Para as pessoas que demonstramos nosso sentimento, são as prováveis criminosas futuras, que irão sem dó, te marcar com um ferro quente – são estas que contribuem, como os pais, para considerarmos o amor o pior entre os piores do universo. Está aí a prova de que falta para as crianças mais realidade e menos ilusão.
          É necessário contar histórias para os infantis, mas que sejam narrativas reais. Mostrar que as pessoas são cruéis e sem senso comum é pertinente. Não é mentindo para as crianças que comendo espinafre, os braços delas ficarão fortes como os do personagem do desenho Popeye. Quando um pai ou mãe produzem uma mentira direta, estão construindo um monstro natural, não um filho sensível e fantástico.
          Precisamos diminuir a poesia, os poemas e o romantismo. Essas fórmulas apresentadas até hoje pela lógica sentimental só produziram bestas com amor e sem caráter. Sem contar que o caráter é uma criação manipulável por pessoas que estão apaixonadas. A comprovação científica disso são as atitudes imorais que o ser humano, ao estar num momento de transe devido ao amor, faz pela pessoa amada. O ser humano ao estar sentindo amor pelo próximo, perde totalmente a lógica. Começa a pensar com o coração – e aí perde tudo, se deixa levar pelo amor, e comete a grande gafe de ludibriar o próprio caráter.
          Se a literatura fosse menos lírica e o amor mais real e palpável, hoje estaríamos, com certeza, vivendo num mundo melhor. Estaríamos convivendo com pessoas agradáveis, frias, e com o real espírito de caráter. Sem amor, o mundo seria literalmente lindo.

sábado, 30 de julho de 2011

A ópera da morte

Por: Gilberto Bernardi Jr.


Quando me deparei com a morte, um concerto formado por anjos e demônios começou a tocar a melodia mais malévola de todos os tempos. Senti nos olhos a acidez de um limão. Nas minhas veias agulhas injetavam as cifras da morte em minha corrente sanguínea. Meu corpo pressentiu a dor em sangue do infarto que atingiu o meu pai. Quatro anos se passaram e a ópera da morte cultua os meus sonhos mais intrigantes. Julho resplandece a cada ano o aniversário que eu nunca gostaria de comemorar, o da morte do meu pai.


          Lembro como se fosse hoje. Uma segunda-feira gelada eu era acordado por minha mãe, no penúltimo dia do mês de julho, no ano de 2007, por volta das seis primeiras badaladas do dia. Assustada, com os olhos arregalados e com uma feição no rosto de que algo iria mudar o transcorrer da família, minha mãe me chamou – “Giu, levanta que teu pai está mal”.
          Meu quarto estava com a luz apagada. Naquela noite eu não tinha sonhado com nada e acordei da mesma forma como deitei. A cama estava intacta. As cobertas não tinham caído e os lençóis ainda estavam ajeitados. Meu corpo não se mexeu um milímetro naquela madrugada. De domingo para segunda-feira meu sono foi leve. Foi a primeira vez, dentro de dois anos que minha cabeça ficou vazia e não antecedeu-me fato algum. Parecia que a mediunidade tinha me abandonado. Engano meu.
          Num pulo eu estava em pé. Já sabia, com os pés quentes no chão gelado, de tudo o que eu tinha que fazer naquele instante que marcaria minha vida para sempre. A passos largos dei a volta na cama, acendi a luz e corri para o banheiro. A porta trancada amenizava o barulho dos pingos que caiam do chuveiro e dos últimos suspiros do homem que virou mito para mim, apenas para mim.
          Minha mãe ficou intacta olhando minha reação. Com a franja dos cabelos em cima dos olhos, parecia que ela sabia tudo o que estava acontecendo, mas não queria acreditar. Ao levantar o braço direito ela passou a mão no rosto, deixando a face limpa. Pude olhar no fundo de seus olhos a cena que eu teria que encontrar dentro de alguns segundos adiante. O que separava meu pai de meus braços era uma porta branca.
          De frente para o banheiro, bati levemente com a mão esquerda na porta e com a voz firme com um ar de descontrole comecei a chamar: “Pai... pai... paie. Paieeeeee”. Ele insistia em não responder. Virei com a cabeça para traz, minha mãe estava atônita. Sai correndo casa a fora. A ideia seria pular a janela do banheiro.
          Fora de casa, com apenas uma camiseta de manga longa, meu rosto sentia o vento gélido daquele mês de julho. O céu azul refletia uma felicidade inexistente e, as nuvens não tinham desenho algum. Eu já tinha pulado varias vezes aquela janela, meus pais geralmente levavam a chave de casa quando saiam e eu nunca tinha cópia. O que me restava era entrar por ali. Era fácil. Pular com as mão para cima, agarrar no vão da parede e puxar o próprio corpo até o lugar das mãos. Com calma, olhei para cima, calculei o pulo e nada. Não tive forças. Eu pensava comigo mesmo. “Meu Deus, é fácil, vamos Giu, pula”. Aquela calçada de lajotas escuras pareciam ter pregos que penetravam na sola dos meus pés, perfurando as camadas de coro, os músculos, os nervos e até os ossos. Por um instante senti a dor de Cristo pregado na cruz. Tentei mais duas vezes e voltei correndo para dentro de casa.
          O som dos meus pés tocando o assoalho despertou os seres superiores. Senti uma vibração, um arrepio pelo corpo. A sensação era de agulhas cutucando minhas veias. Cerrei os punhos com toda força que tive e por milésimos de segundos um ar soprou no meu ouvido me indicando a direção da porta do banheiro.
          Minha mãe estava no meio da sala agoniada e assistiu, como o mesmos olhos que minutos depois iriam se encher de lágrimas, eu passar por ela como um raio que cai do céu e sem piedade explode onde pega.
          Visualizei a porta e me joguei com os dois pés contra ela. Não lembro se eu respirei nesse momento, só tenho certeza que não senti dor física alguma. Com a porta do banheiro escancarada no meio do caminho, eu só pensava. “Aguenta, pai, aguenta”. Coloque a porta no lugar, abri o box, fechei a torneira do chuveiro. Duas voltas foram suficientes. O dia 30 de julho e o pesadelo da minha infância tinham dado boas vindas, mas eu não estava pronto. Olhei para o meu pai e gritei para a minha mãe: “Chama ajuda manhe, chama ajuda. Rápido”.
          Aos prantos e gritando loucamente por socorro, a ira dos demônios acabara de aflorar. Uma cortina de sangue e desespero se abriu em minha mente quando eu escutava a vóz da minha mãe implorando por ajuda.
          Olhando meu pai caído no chão do banheiro, engoli a minha saliva a seco e me sentei na frente dele. Comecei a dar tapas na cara do meu pai falando. “Pai, acorda. Levanta, vamos. Vamos, levanta. Aguenta mais um pouco, pai, vamos lá, não me abandona agora”. Nesse momento os demônios riam da minha cara e os anjos não me ajudavam. Até que soltei um grito arrozinte com o intuito de espantar para longe dali os demônios, os anjos e até mesmo a morte. “Não me abandona agora pai. Acorda!”. Pensei que tinha dado certo, meu pai lentamente abriu os olhos. O chuveiro deixou cair um pingo de água, que escorreu por toda minha coluna. Parecia uma lamina cortando cada vertebra. Todos sumiram do local, menos meu pai, eu e a morte que, apenas tinha adormecido para dar a punhalada final. Pelas costas senti a morte inabalavelmente atravessar meu corpo através de minhas costelas e atingir o coração do meu pai.
          Com os olhos abertos e a boca tentando sugar as últimas doses de ar desse mundo, meu pai olhou fixamente para mim de um jeito inexplicavelmente sem vida e falou as últimas palavras através do silêncio. “Chegou a minha hora, eu preciso ir”. Minha alma estarreceu. Os demônios se afastaram e uma legião de anjos tinha acabado de chegar para leva-lo. Os seres de luz cortaram o cordão de prata e meu pai foi fechando os olhos para sempre. Meu corpo sagrava de dor e eu enfrentei todos os demônios, nenhum se atreveu a me encarar por que nos meus braços, meu pai estava morto.
          A água que escorria pelo corpo do meu pai e era sugado pelo ralo, levava para o esgoto toda minha vida. A ópera da morte estava iniciando.


Continua...

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Desjejum cotidiano

Por: Gilberto Bernardi Jr.

"Uma profissão com pouco prestígio, esquecida e desvalorizada. Alunos iludidos e jornalistas sem ética. Uma profissão que pode ser exercida em qualquer botéco de esquina".



          A mesa está abarrotada de trabalho. São folhas brancas e recicladas, dicionário, um copo sujo de café e bilhetes de reuniões colados na tela do computador. E-mails para mandar e pautas a serem feitas, mas... vejo que o trabalho de um jornalista é realmente sujo e vulgar.
          A relação notícia/emprego é tão antiética que resta olhar para trás e ver que me faltou apoio para cursar medicina. Esse mundo fantástico prometido pela mídia é manipulador tanto quanto a faculdade, que diz transformar seres mortais em formadores de opinião. Já tentou opinar fora da linha editorial? Eu já dei um de revolucionário sem causa. Resultado: fui bater na porta do concorrente – fiquei um ano e alguns meses na mesma situação de milhares de brasileiros que aumentam a lista de desempregados. Essa lista é publicada todos os meses por um colega de trabalho, que nem sabe que existo, mas cumprimento-o todas as noites, após ouvir o repertório de manipulação. Plim Plim.
          “Ser jornalista é o máximo. Dá pra escrever e falar o que se pensa, ter acesso a lugares que os cidadãos normais não têm”, todos já pensaram isso na infância. Essa estória de que profissional da comunicação com habilitação em jornalismo pode opinar sobre todos os assuntos, só existe no conto de fadas do jornalismo independente – apenas entre nós, mas jornalismo independente é como acreditar que os políticos vão cumprir o que prometem.
          Para que serve um jornalista? Para informar a massa o que nem ele acredita. O pior está por vir – noticiamos algo que está errado, sabemos que não está certo, mas temos a cara de pau de crer na veracidade dos fatos improcedentes. O povo, que por sua vez, é ingênuo, ri da nossa exposição e mesmo assim, nos tem como fonte segura e confiável. “Tu viu só o que a RBS noticiou hoje?”, afirmam.
           “E no futuro estamos nós”, sentados em frente a um computador digitando palavras incomuns para compor uma notícia do cotidiano. Ficamos com os olhos esbugalhados, com dor nas costas, dentes pretos (efeitos do café), resmungões e ganhando uma miséria. Que graça tem? “Ah! mas o jornalismo é a atuação direta do social, nos faz ser mais humanos em ver a situação de pessoas que estão ou não numa condição complicada”, falamos, com autoridade “mauxima” quando formandos em jornalismo. É a desgraça dos dias que virão.
          É uma profissão de equilíbrio emocional. Uma questão de redundância diária. Ser jornalista é saber lidar com a escolha do regime capitalista. Noticiar as greves das diversas categorias que se opõe ao salário baixo, dar o maior apoio a manifestação, mas se esquecer que também ganha pouco e não faz nada por isso. “Nóis semo tudo jornalista instruído e com o tal do diproma na mão”. Convida um colega para fazer linha de frente e discutir a questão do piso salarial. “Você tem razão, não ganhamos nada, só não te ajudo com isso por que tenho que trabalhar agora”, responde com proeza o formador de opinião.
          Jornalista nem sempre escreve bem. É um profissional que “necessita” saber sobre tudo, mas não sabe nada. Na faculdade enche a boca pra dizer que é jornalista e quando se forma vai ganhar entre R$ 1 e 1,5 mil e se desanima. Vê que é bom ganhar dinheiro, mas que com essa profissão nunca vai morar num bairro nobre; vai ter um gol ou um uno 1.0 porque faz média melhor. Vai querer criticar juízes, políticos, advogados, médicos, mas vai esbarrar na lei. Na lei que a empresa para qual trabalha criou. “Sempre publicar noticias que remetam ao público coisas boas das pessoas que tragam benefício para a empresa”, direciona o chefe. Aí o jornalista se dá por conta que os quatro anos de estudo sobre a ciência da informação nada valeram. Na universidade discutem a respeito de linhas editoriais, mas não ensinam a respeito – é que quem faz o curso é o aluno (tinha esquecido de citar).
          Ser jornalista é ser irônico com si próprio. É achar que goza dos erros alheios, porém o que erra sempre ganha mais que o jornalista. Ganhar é o que vale. Mundo melhor só existe na utopia dos comunistas de plantão (ser militante comunista é igual ou pior que um jornalista). Imagine um jornalista comunista? É acreditar piamente na epistemologia do sonho.
          Entretanto, o jornalista deveria ser estudado por cientistas não cristãs: não existe “homem mais besta que um jornalista”. No curso diz ter atitude própria, depois de formado adota a personalidade que a empresa ordena; acredita ser superior, no fim o público se diverte com o camarada em frente às câmeras de TV (idem outros meios de comunicação) e sai falando das palhaçadas feitas no ar; as notícias impressas que demoraram horas, talvez meses para serem publicadas, no outro dia estão enrolando salame no boteco da esquina ou limpando a entranha de um terceiro; não tem o trabalho reconhecido; a informação, por mais importante que seja, é abstrata, portanto se torna nula e o jornalista só é lembrado naquele instante: é como o BBB, só se é famoso enquanto aparece na tela, depois de eliminado faz alguns trabalhos para revistas de prazer (isso se tiver um copo que é possível usar photoshop) em seguida é esquecido; acha que é a melhor profissão do mundo, por esta ser conhecida com não ter rotina, o que é mentira: todo jornalista está sempre com um bloquinho e uma caneta na mão escrevendo meia dúzia de palavras, para depois voltar a redação e escrever a besteira colhida; acredita que jornalista bom é jornalista com formação superior, mas os meios de comunicação estão lotados de pessoas com ensino médio e que possuem uma voz agradável, detalhe: o jornalista formado vai receber ordens de um depravado, que provavelmente tem muito mais noção de comunicação do que o recém formado (agora sim se comprova que o poste mija no cachorro). Na faculdade dizem que a voz não é importante, na primeira aula de rádio informam que a voz de todos os teus colegas é boa, pena que o mercado de trabalho não pensa assim. O jornalista é o único sujeito no mundo que consegue se auto-manipular.
          Outros pontos chamam a atenção dessa brilhante profissão, quando se é assessor de comunicação, os funcionários confundem jornalismo com publicidade. E é isso aí mesmo, jornalista não passa de um fofoqueiro. Um leva e traz de informações mesquinhas que, em momento algum, é a estrela do espetáculo, apenas é usado para levar as pessoas ao sucesso. Para levar as pessoas a ganharem muito dinheiro em cima das informações que o jornalista “fofoqueia”.
          Jornalista é o pior político do mundo. Numa aula, uma professora contou que discutiu com um médico. O profissional da saúde teria dito que médico é uma profissão descente, pois cura as pessoas (médico ganha muito bem e valoriza a própria profissão). A professora respondeu ao “dr” que jornalista é médico da alma. Depois disso pude entender por que rezamos tanto para as almas que estão no tal purgatório – essas almas leram muita bobagem que nós escrevemos. Agora se comprova, literalmente, que o título do livro do jornalista Carlos Dorneles, Deus é inocente, a imprensa não, está totalmente correto. Estamos na berlinda.
          Se o jornalista fosse tão inteligente quanto aparenta ser, já estaria ganhando melhor. Seria uma classe unida, que defenderia acima de qualquer motivo a ética na profissão. Se o jornalista fosse ousado, invadiria o congresso e exigiria que a profissão fosse reconhecida. Se jornalista fosse realmente crítico olharia melhor para seu próprio eu interior.
          O jornalismo pode ser um curso técnico de seis meses, no máximo. Não vejo necessidade de se estudar quatro anos para tal profissão. Uma carreira que, em pleno século XXI, ainda está em estudo no congresso nacional para ser aprovada como uma ciência que necessita de ensino superior para poder praticar, é ridículo. Para ser jornalista basta saber um pouco de português, ter noções de lead e agir por instinto.

domingo, 11 de abril de 2010

Amigos não existem

Por: Gilberto Bernardi Jr.



“Os tão procurados amigos são encontrados nas profundezas mais escuras da solidação. A base de um bom amigo está na conta bancária”



          Uma vez me falaram que para ser feliz era preciso ter amigos. Prefiro a solidão. Talvez nas antigas os camaradas fossem mais apegados aos sentimentos e davam mais valor a felicidade e a angústia.
          Sempre acreditei no que me falavam naquela época – dinheiro não é tudo na vida – as amizades são as coisas mais preciosas que possuímos. Hoje sou descrente dessa idéia supérflua. Nas viradas de ano, que não há motivo algum para ser comemorado com a família, peço saúde e grana, por que o resto podemos comprar.
          Talvez pense assim por ter sido criado num ambiente de amor, onde os contos dos livros de fada eram mais importantes do que cifrões no bolso. Hoje prefiro a realidade, já que amigos podem ser comprados.
          Ninguém, nem hoje e nem nunca, morreu por um amigo. Talvez no passado, mas não há comprovação. O problema de tudo é o amor. Amor entre pais e filhos, entre amigos que na hora que você mais necessita, somem. Na realidade o amor é um sentimento que deveria ser excluído do mundo, uma vez que consome o ser humano e o faz agir por impulso. O amor é o sentimento mais falso do universo.
          É demagogo o ser que usa o amor para se auto-promover: quem não gosta de ouvir palavras amorosas no pé do ouvido? Quem não aprova a sensação de se sentir amado? Quem não fica com os olhos brilhando quando um suposto amigo aparece para socorrer do perigo? Todas as respostas são enganosas. Serás amado quando puder proporcionar a alguém algo que nunca teve. Só ficarás com os olhos brilhando quando veres que estiveres no pior e provar por A mais B que levantar-se-á apenas com o teu suor, pois ninguém vai socorrer-te. O amor é o sentimento que mais mata no mundo. As pesquisas comprovam que assassinatos, homicídios e outros tantos crimes bárbaros foram em decorrencia do amor.
          Quando era pequeno meu pai fazia, quase que sem querer, demonstrações de afeto (talvez não o tenha recompensado), mas foi por causa desse amor involuntário que prefiro uma realidade crua e um sentimento frio perante todas as pessoas. Foi amando os amigos que a felicidade foi sumindo. Foi sendo gêneroso e acreditando nos irmãos do peito que meu pai acabou quebrando e literalmente o matou.
          Não há prova mais contundente na vida do que sentir na carne o sofrimento que o amor pode causar. É por isso que não podemos, por exemplo, acreditar em psicólogos: como podem tratar alguém se não sentiram tais doenças causadas pela ternura?
          Quando o sentimento financeiro está ótimo o amor sempre está florido. Compramos o amor da ajuda; o amor da compaixão; o amor da amizade; o amor da fé. Compramos, com dinheiro, o amor mais puro do universo.
          Amor não existe, a realidade que é manipulada por ele. Prefiro a solidão dos amigos e a amizade do financeiro – o amor foi capaz de matar Jesus Cristo, quem dirá a nós, simples seres mortais.

sábado, 23 de maio de 2009

O Deus do nada. Um santo demasiadamente ateu perante a própria existência.

Por: Gilberto Bernardi Jr.

Uma santidade desconhecida tenta nos impor sua existência sem nunca termos o ouvido, enxergado ou tocado. Um líder pervertido e débil que nos obriga a seguir seus dogmas. Uma estória mal contada e misteriosa que nem o próprio Deus sabe explicar. O ser celestial pecador e errante. Um extremista imperador que escolhe o pior caminho para o povo que criou e diz ser a salvação.


          Onde está o tão poderoso Deus? Pouco importa quantos deles existem ou quantas religiões e seitas poderão ainda surgir para pregar o nome do senhor. Só entendo que venho perdendo o vínculo com esse tal Deus há um bom tempo. Pra começar eu nunca o senti e muito menos o enxerguei, apesar de acreditar nessa santidade.
          Acredito em Deus, mas não concordo com algumas decisões banais e sofredoras que o homem precisa passar para chegar até esse manipulador frustrado de mentes.
          Partindo do ponto de vista sobre o livre arbítrio, me coloco em posição única de sobrevivência para executar minha reação. Por exemplo, se relacionado ao mundo cruel onde vivemos, tenho a liberdade de ser um imbecil e poderei passar a perna em qualquer idiota que se atreva a cruzar meu caminho, certo? Não. Levando em consideração de que apenas os bons ficarão ao lado direito do pai todo poderoso, se você for uma má pessoa, não ficará ao lado de Deus e irá para não sei onde. Com isso, desfaz-se a lenda de que o livre arbítrio existe. Deus é um imperador malvado que ordena todos seguirem seus mandamentos, caso contrario, a guilhotina, mesmo tendo poucos anos de existência, será ainda mais útil.
          Se algum dia eu ficar de frente com o Deus, vou dizer em todas as línguas que ele é um fútil, retardado e imbecil. O pior ser que já existiu em todo o mundo. Na realidade, Deus é pior que o Diabo. Para se chegar, ou tentar chegar ao lado do criador é necessário passar por vários sofrimentos. Já, para se chegar ao inferno, o caminho é mais fácil. Ou seja, além de burro, por ter criado o lado mau da vida, Deus é a pior celebridade de todos os tempos: não pode ser tocado e nem visto. Alguém já conseguiu um simples autógrafo de Deus? Não. E ainda questionam Hitler – pelo menos ele tinha um objetivo cabível.
          Deus é a “coisa” mais contraditória de todos os tempos. Ele criou o homem e deixou Jesus, seu filho, ser morto pela própria invenção. Detalhe: a própria igreja, que prega o nome do senhor, matou o filho de Deus e, mesmo assim, o fundador do mundo não faz nada. Deus é a teoria do caos.
          O pai de todos foi tão e continua sendo inconseqüente que consegue despertar nos povos a vontade de contribuir com as guerras. Um motivador sanguinário e impiedoso. A confirmação de quanto Deus é um político de má fé com o homem é a guerra santa.
          Algumas crenças dizem que Deus é a natureza. A natureza nos encanta por sua força brutal; pela beleza incondicional em suas diferentes formas e, isso, é inquestionável. Entretanto, chega-se a conclusão, mais uma vez, que Deus está perdido no mundo e não sabe o rumo que deseja tomar, quem dirá perdoar as pessoas. Vejamos: se Deus é natureza e criador do homem, e o próprio sapiens que é o contribuinte direto na destruição de seu mundo (natureza que é = Deus), Deus, por sua vez, não nos perdoa e nos da o troco na mesma moeda, com enchentes, furacões, chuvas, aquecimento global... Ta, e onde está o perdão do paciente senhor de todos nós? Deus não é o caminho do perdão? Da salvação? Se Deus é natureza, então por que a revolta? O filho Jesus, nosso “irmão” ingênuo, deu o outro lado da face para levar um segundo tapa. Hoje, quem nos dá o tapa na cara é o pai de Jesus. Qualquer ser criado por Deus e com discernimento lógico, consegue entender – Deus é um objeto de zombaria.
          É normal encontrarmos quadros de Cristo de braços abertos, com os olhos tristes e uma cara fechada, com uma frase dizendo: Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai a não ser por mim” (João 14, 5-6). Só me pergunto, baseado em que esse cara diz isso? Talvez esse Cristo tenha, no mínimo, perdido o bom senso ou a coroa de espinhos afetou o cérebro (se tratando de Deus pode ser célebro) causando amnésia. Como é que vamos seguir Jesus se ele morreu numa cruz por tentar passar os ensinamentos de um pai, que no pior momento da vida do filho, no caso a morte através de espancamentos, nada fez? Semioticamente, a imagem de Cristo nesses quadros não é nada agradável. Passa-nos uma mensagem de sofrimento, tristeza e angústia. Você quer ir até Deus? Se a resposta for sim, terá que passar por tudo o que Jesus passou, inclusive ser pregado numa cruz, ser coroado com espinhos, ser incansavelmente açoitado, apedrejado, demolido, escravizado, gozarão da tua cara e, ainda, quando você estiver pedindo clemência, um dos teus irmão (perante Deus somos, utopicamente, irmãos) vai te furar um pulmão com uma lança... E se você gritar – “Pai por que me abandonaste?”. Deus não vai te ouvir. Se não escutou o próprio Jesus, qual o motivo que o levaria a deixar de ser surdo, se a lei dele é de que somos todos iguais?
          Outro ponto intrigante é em relação à parte cientifica do selvagem ser de energia. Por que Deus não deixou nada cientificamente comprovado de sua existência? (a criação do mundo não é evidenciada que foi Deus, por existir teorias que também não se comprovam, assim, estão na mesma linha de desconfiança). Um filho que não conquistou o mundo não pode ser considerado comprovação de existência de Deus, devido à falta de “persuasão” de Cristo. Por que Deus não nos fez com uma idéia fixa de sua existência? Se fizesse isso, não aumentaria a idéia de ser um imperador com constantes crises de abuso de poder, muito pelo contrario, apenas evitaria discussões que inibem, por exemplo, o desenvolvimento na cura de doenças ou males, criados por ele mesmo, como é o caso da interferência direta do Cristianismo ao ser contra pesquisas com células tronco. O cristianismo é citado aqui, por ser a referencia de Deus e uma das maiores e conturbada entidade no mundo que vivemos - por mais porcas que sejam as igrejas e, mesmo pregando um ideal extremamente capitalista e nada humanista, foram criadas, assim como todas as desgraças do universo, por influência de Deus.
          Baseando-se na bíblia, cuja autoria deixa dúvidas, o filho do Senhor dizia estar seguindo as vontades do pai, mas, em momento algum, Cristo fala sobre a fisionomia do dono de tudo. Cristo foi um político demagogo, tanto que foi traído por seus seguidores. Pedro recusou, por medo, o nome do ideal por três vezes. Judas, que se arrependeu depois, se não o mais realista de todos os 12, o entregou para a morte. Tomé, o cético, até hoje tento entender por que seguia o mestre de carne e osso, se era tão incrédulo. Lembrando que Jesus, de acordo com a bíblia, reuniu os doze apóstolos e deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demônios, e para curar enfermidades. Até hoje, não se sabe se alguns desses charlatões curaram alguém. Mas, é comprovado que trouxeram através da pregação do evangelho e com a criação das igrejas, lutas e derramamento de sangue em nome do Senhor.
          Deus é um cara estranho. Não gosta de ouvir opiniões contrarias e, pelo jeito, odeia ser questionado quanto ao poder que possui. No Titanic, havia uma faixa escrita: “Nem Deus afunda esse navio”. Resumindo: aconteceu o maior naufrágio da história. Um candidato a presidência, esse brasileiro, disse em um discurso que se obtivesse 500 votos do próprio partido, nem Deus conseguiria fazer com que perdesse as eleições. O candidato ganhou, mas morreu um dia antes de tomar posse. O vocalista de uma banda de rock cantou “Não me impeça, vou seguir o caminho até o fim, na auto estrada para o inferno”. Em 1980 foi encontrado morto, asfixiado pelo próprio vômito. Comprova-se aqui que Deus sofre de uma personalidade bipolar. Em momentos de estima baixa é melhor apenas pensar que ele é o senhor dos senhores. O mais forte, a salvação o tudo. Caso contrario ele te tira a vida, sem piedade. "Não vos enganeis, de Deus não se zomba, pois tudo o que o homem semear isto também ceifará", diz a bíblia. Essa frase relata o quanto Deus é egocêntrico.
          Não sou contra Deus. Acredito na existência desse ser, mas não tenho fé. Deus deveria ser mais consciente e muito mais influente para que as coisas boas viessem a acontecer com mais freqüência. Deus é demasiadamente ativo em contribuir com que o ruim tome proporções mais elevadas que o bom. Pelo que ele nos passou até hoje, é que todo mundo tem direito a fazer o que bem entender, basta se arrepender depois, desde que o ser celestial não seja atacado direto ou indiretamente. Não tenho fé em Deus pela história ser tão misteriosa e não termos acesso a esse enigma. Como posso acreditar em algo que não vejo? Em algo que não sinto? Como posso me ajoelhar e rezar por alguém que faz do sofrimento alheio a própria diversão? Como posso ter fé num Deus que esconde a própria história? Que nunca se manifesta? Um Deus que nos impõe suas vontades sem querer saber se gostamos ou não. Um Deus, que algumas pessoas dizem ser o paraíso, que prefere ver o homem derrotado no meio da luta, para poder alcançá-lo. Que líder escolhe o pior caminho para o seu povo? Deus.
          O homem tem quer rever todos os dias os conceitos para conseguir se desvencilhar das estradas cambaleantes do criador. Por sua vez, Deus continua um conservador de uma idéia inicial – “a minha criação que me obedeça”. Caso nós criarmos novos caminhos, Deus se sentirá ofendido, e tirará algo de valioso de você. Deus é o próprio vento negro. Deus é um inseguro que usa do poder, de forma errada, para nos intimidar e nos obrigar a venerá-lo. Deus erra e ninguém o pune.
          Acredito em Deus, mas tenho fé apenas em mim.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

A brisa das onze

Por: Gilberto Bernardi Jr.


"Algo mágico acontecia naquele instante. Uma sensação, um sonho e um segredo que até hoje meu cérebro não consegue entender".

          A brisa das 11 horas entrava pela janela que ficava de frente para a rua. Ao chegar ao apartamento, no primeiro andar, número 102, eu esbarrava num momento que jamais iria esquecer. No rádio, um CD com músicas diversas tocava sempre a quarta – Um Girassol da cor do seu cabelo. O sofá, à esquerda, guardava o vazio dos anos seguintes. Uma colcha branca, comprada de um vendedor de rua, aqueles que vêm do nordeste, escondia os retalhos que o cachorro fizera na espuma há uns anos. As paredes brancas lembravam um hospital aconchegante. A TV, de 14 polegadas, era posicionada frente ao sofá, mas naquela época as ondas radiofônicas eram mais companheiras do qualquer imagem. A mesa de centro, de cor marrom, com cantos pontiagudos, além de se mostrar humilde, segurava na parte superior os destroços da festa da noite que acabara de amanhecer.
          E ali estava minha irmã e eu, num apartamento de dois quartos. Uma sala grande com poucos móveis; uma cozinha, uma lavanderia, um banheiro e por incrível que pareça, quatro janelas, por onde o vento corria livre entre os cômodos. Éramos dois das sete da manhã até as duas horas da tarde. No outro intervalo de tempo, o um mais um chegava a oito.
          O que mais chamava a atenção era a décima primeira badalada do dia, no abrir da janela central daquela caixa repartida. A sensação de estar lá, com a brisa ventando calma na primavera, deixava a mente numa situação inexplicável de bem estar. Isso faz falta hoje. Não da mais para sentir aquele vento liso no rosto. Fico me perguntado, cada vez que me deparo com uma janela, qual o motivo desse saudosismo? Mas cada vez que olho para um reflexo de vidro, mesmo que miúdo, ele me da à resposta.
          ...Quando a noite chegava, a imaginação de dias saudáveis aumentava no exato momento em que a porta era aberta. Um dos dedos, quando não era a palma da mão, apertava o interruptor da luz. Uma lâmpada de 60w se misturava com o que estava parado na sala, dando vida aos objetos que pairavam sem nada a falar por ali. Tudo mudava quando a cortina verde-escura era aberta.
          Em frente à janela principal havia um poste de luz. Todas as noites eram iguais: as luzes do apartamento eram desligadas, assim como os noticiários. O rádio tomava conta do silencio e ficava como trilha de fundo. O sofá batido nos acolhia como um abraço apertado. E ali deitávamos minha irmã e eu - janela aberta com uma brisa fresca junto à luz amarelada do poste da rua. As sombras das grades se estendiam até a parede branca, dando um ar, ao mesmo tempo, sinistro e pensante. Logo em seguida um comentário qualquer, num tom uma oitava acima do som do rádio, nos fazia gravar aquele instante que, hoje, me faz escrever isto: a lembrança de algo tão simples que dá vontade de pedir apenas mais um dia para morar com minha irmã e deitar naquele sofá, no mesmo apartamento, no mesmo tudo.
          Era diferente, explicável, porém indefinido. É como se quando fazíamos a rotina de abrir as janelas e sentir a brisa das onze horas, da noite ou da manhã, e ficar sendo embalado por aquele momento gigante, com música e luz amarela, virasse magia. O pensamento flutuava, nos colocava perto do mar. As fronteiras de tempo e espaço se perdiam em meio aquela multidão de silencio que se quebrava em meio as oitavas acima ou abaixo do normal. O instante de euforia era traçado pela bonança, assim como as ondas que escavacam com brutalidade a areia da orla e voltam afetuosas ao fundo do mar. Aquele momento era estonteante. Mas assim como os mortos, o tempo não se levanta, nem flutua, nem absolutamente nada.
          Aquela brisa se distinguia de todas as outras. A brisa das onze tinha ouvidos e, às vezes, até falava. Aquela brisa não tinha hora, bastava abrira a janela e lá estava ela, com um cardápio perfeito de emoções. Ao entrar sem pedir licença, a frágil brisa me levava embora desse mundo, mas a próxima rajada de vento me indicava que o norte a ser seguido seria cruel. Lembro que o momento em que ela me levava daqui, os poucos segundos que se viviam intensamente dentro da brisa, daria para trocar a eternidade por tal instante.
          Hoje os cartazes a procura de uma nova brisa são costurados entre as horas e, o achado são ventos contínuos sem muita expressão. O que consigo igualar com o velho tempo é a procissão da rotina do fechar da janela. Quando eu acordava no meio da madrugada, com a brisa embalando meu sono em tom de despedida, levantava do sofá, sentava-me nele, com os pés descalços no piso gelado de lajotas brancas, sonolento caminhava vagarosamente com destino a luz do poste da rua, esbarrava nas grades da janela imensa e me dava conta que o dia ainda estava aí. Com a mão esquerda apoiada na parede, jogava o peso do corpo nesse braço. A mão direita agarrava um parte de janela, com um leve esforço ela ia se fechando e minha cabeça começava a entender que a brisa só voltaria no dia seguinte, às onze horas. Com tudo fechado, um bocejo saia pela minha boca, meu corpo voltava a posição rígida, meu olhos olhavam por alguns segundos entre a janela - e a brisa seguia seu rumo incerto. As pernas, sincronizadas, tomavam o caminho do quarto. Ao deitar o sonho voltava a si e eu apenas esperava pelo outro dia. Esperava pela brisa.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Entre todos existe algo estranho...

Por: Gilberto Bernardi Jr.

...É como colocar o próprio homem num círculo vicioso cheio de coisa alguma. Vivemos engolindo os dias e bocejando as noites. As manhãs são reservadas e com um pouco de sol.


          Ficaremos acordados a noite toda, vamos encarar o sono de olhos abertos, teremos que senti-los. Vamos, ao menos, tentar colocar o nosso corpo em posição de ataque, para que a fantasia conheça o próprio sentimento. Ao darmos o primeiro bocejo será o primeiro sinal: precisamos de um copo de água.
          Calaremos a nossa madrugada bem no cantar dos pássaros. Sentir na pele o valor de uma noite, o valor da lua. Sentir toda escuridão da solidão e não fechar os olhos esta noite. Vamos brindar o labirinto da insanidade, bater de frente com o olhar puro de uma criança adulta. Escutar com os olhos arredados o som gritante das três primeiras horas do dia.
          Vamos encontrar uma maneira errante para esta noite dar certo. Planejar os movimentos e adormecer quando tudo estiver com um raio de sol. Precisamos do silencio para curar toda essa falta de você. É necessário o silencio para não pensar no próprio sono. Precisamos de água limpa.
          Quando o segundo bocejo chegar a boca, vamos levantar e caminhar pela sala, ficar atento aos passos. Jurar a si mesmo que existimos e precisamos de água. Vamos programar e passar a noite em claro, adormecer com o cantar dos pássaros e quando a noite estiver se posto, regressaremos.
          Hoje a janela se abre de vagar, sem o menor condicionamento físico. Sinta toda a fantasia dos sonhos. Seremos os guias com o terceiro bocejo. O sono só ataca sem água.
          O pulsar é o álibi. Brindar a noite como fosse à sétima. Sentiremos o planeta abaixo de nós. Decifrar os quadros 3D e não perder a cor. Tocar nos maiores sonhos, subir a escada da eternidade, degrau a degrau, para esbarrar no muro imundo dos céus.
          Subir no cume das energias e arrastar o diamante da mentira envolta naquilo que não se pretende explicar. Isso vai ser nessa noite inanimada. Estaremos com a alma em pé, acordados com filosofias póstumas, brindando com uma taça cheia de nada. Ao nosso lado, apenas ao nosso lado.
          É como escutar a mais alta das músicas num dia de chuva. É como sentir o corpo arrepiar quando sentimos o vento bater rente ao rosto; é como ser um escravo da fraqueza, que não é nada menos do que a ausência da coragem.
          Hoje é como escrever um monte de coisas e, ao ler, ver uma página em branco. Hoje, só hoje... Depois tudo passa...

domingo, 9 de novembro de 2008

O triste espetáculo de uma vida

Por: Gilberto Bernardi Junior

           Apenas um texto. Sem explicações, sem sentimento (contraditório)... Apenas um texto manipulado, pois a realidade traria a tona a política suja e nojenta que não preserva vidas. Apenas um texto que não retrata que, no dia em que senti a morte na pele, o médico, que deveria estar em plantão no local de trabalho (para salvar vidas) foi dormir em casa, já que 24 horas antes, estava tomando cerveja num bar de Campinas do Sul. Atualmente, o médico que deveria fazer valer o juramento de faculdade de medicina, continua vivo e enganando pacientes. Já, o meu pai, está morto.



Palavras pré-meditadas. Nem perto da ousadia da morte


          Pensava que era o super-homem, mas me enganei e fraquejei. Parece que nunca vai acontecer, mas quando menos se espera o escuro estampa a nossa face. Coloca-nos numa situação de impotência. Mostra-nos o quanto somos fracos, o quanto somos nada. Tu usas todas as forças. Grita. Tenta reagir. Quebra uma porta com brutalidade e não acredita o que vê. Você vê a imagem refletir num espelho... A imagem retorcida do desespero. E dizem que somos fortes... Engano
          O desespero de um grito calmo foi tão alto, que a única pessoa que necessitava escutar, encontrava-se embalada pelo som dos anjos. Meu pai dizia, quando vivo - “Se eu avançar, avance comigo, se eu desistir e voltar, atire em mim, pois estarei indo contra todos os meus princípios”. Caído no chão, com o corpo a mercê da morte, seu olho escutou uma pequena frase. “Não me abandona agora pai”. O olho, já sem aquele brilho verde misturado com amarelo, abriu por um segundo e falou firme, porém suave – “Segue. Vai em frente... agora está com você”...
Entendi que a mensagem passada naquele instante, enquanto o coração do meu pai sangrava pelo infarto fulminante do miocárdio, e o meu sangrava de desespero, junto à impotência e insegurança, é que o triste espetáculo da vida tinha um início, 31 de julho de 2007.
          Fiz de tudo, não o possível. Não desisti um segundo, segurei firme e minhas lágrimas não caíram naquele momento. Eu tentei, e isso, não foi o suficiente. O mundo se calou em um instante. Calou-se no eterno.
          Não sou o super-homem, nem o Spider-Man, nem o Capitão América (herói de infância, ganhei a roupa do meu pai) nem nada. Quando fiquei sabendo que não era isso tudo, a frustração foi tão grande que ainda me pergunto o motivo pelo qual me leva a encarar o tranco.
          E nada restou... A superioridade ficou por conta da impotência, da revolta. Falta a gargalhada, sobra tristeza. Inconformismo. As lagrimas caem incansavelmente. Parece um mar de desilusão, um pouco maior... Bem maior. Incontável. E o GUERREIRO REPOUSOU.
          Enquanto a água do chuveiro escorria pelo ralo, passando pelo corpo do guerreiro, ela levava junto um pedaço da minha vida. Um pedaço que, sem querer, se misturava com a minha falta de força.
          Dizem que vão os bons, os Guerreiros bons por primeiro. Após a luta incansável, o Guerreiro repousa. Saem no melhor da festa sem ter dançado a ultima música (ele gostava do Bial). Dizia ele, o Guerreiro, isso é uma passagem. “Eu vou viver 100 anos”, afirmava meu pai, que foi traído por uma força maior, a morte.
          O Guerreiro sonhador, brincalhão, até no leito de morte sorria. Não existem palavras de consolação e nada ameniza e nada adianta. Então somos limitadíssimos, então somos coisa nenhuma.
          Deitamos rindo e “acordamos”, de fato, mortos. Não acordamos. Puxamos o ar e, talvez, não consigamos soltar. É possível até de tentar falar uma frase inteira e esquece de avisar onde é o ponto final. Depois de um tempo, o ponto se coloca sozinho e indica o fim da linha. Ponto.
          Falam que é preciso estar preparado para a única certeza da vida, a morte. Se o cara lá de cima criou à vida e, consequentemente a morte, poderia ter esquecido de criar o sofrimento, a dor, a perda, o nada. Poderia ter sido mais humano e menos espírito... Por que sempre os bons ao lado dele? Por que sempre os melhores? Os que fazem mais falta aqui nesse mundinho? Por que ele não avisa que vai nos passar uma tranca quando estamos com o corpo mole? Por que a gente não nasce com um botão de on e off? E sem respostas, O Guerreiro repousa.
          Largam o escudo, baixam a guarda e limpam a espada. Deixam apenas a armadura por aqui e somem, desaparecem. Olham-te por uma última vez, talvez duas, e... Deixam-nos arrepiados. Vão caminhando em direção a não sei aonde e nem se quer dizem adeus, apenas uma mensagem nas entrelinhas de um último olhar.
          Dizem que aquele lugar, que não conhecemos, é lindo e tem violetas na janela. Dizem que o sol irradia as manhãs de uma forma jamais vista. Dizem que as pessoas são legais e que todos são Guerreiros de luz. Dizem que as ondas do mar, no por do sol, beijam os pés de quem caminha descalço pela orla dos céus com os lábios da virgem Maria. E os que ficam? Que explicação nos dão? Nenhuma. Deixam-nos lembranças, lágrimas e desconforto apesar do conforto lutado na batalha de uma vida de meio século.
          Joga-se a morte contra o muro da eternidade e ela volta com tanta força do lado esquerdo do peito, que nem a estrutura, que é feita do melhor material resiste a essa energia do outro mundo. Em segundos infinitos, a morte toma conta de tudo o que é mais sagrado. Tira-nos do colo a segurança e ficamos desolados. E o GUERREIRO REPOUSA no manto eterno. Calmo, afetuoso. Consolado por uma legião de guardiões.
          Damos um giro de um milhão de graus. Dorme-se sorrindo e se acorda chorando. E não somos o super-homem. Nem somos uma pedra rochosa. A mensagem que fica é a de um dicionário de palavras sem significado. As teorias em relação à vida e morte se desfazem. O imaginário entra em ação. O medo, a insegurança, o perdão, a impotência, o clamor, a raiva e tudo o que existe se torna inevitável e ridícula quando sentimos a falta de vida em nossos braços. Não sou um Guerreiro como meu pai. Estou longe, muito longe disso...
E o Guerreiro de luz segue a sua saga de vitórias em uma outra batalha, enquanto eu, um aprendiz a partir do ano que continua vivo e impertinente em minha memória, tento colocar em prática o que o Guerreiro do Repouso eterno me ensinou em seu bravo duelo por aqui.
          Nasce-se novamente, só que não tem ninguém para ensinar o que é certo ou errado, nem para dizer qual caminho seguir, entretanto, aprende-se pelo instinto, pelo alvitre. Dança-se uma nova música sem saber o ritmo. Eu não consegui ser o super-homem. E a nuvem negra tapa o nosso rosto com gotas de morte. Premonição existe.

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Tudo tem um final. Ele está depois do ponto.

Eu juro que tentei um pouco de tudo pai, mas não deu. Eu to tentando ser forte e sóbrio, mas não é fácil. Eu juro que usei todas as forças para não te decepcionar, só faltou um médico aquele dia. Aquele dia ainda não terminou. Aquele dia fica acordado e não dorme nunca. Isso dói. Agora falta o carinho, a risada, os conselhos, agora falta tudo, agora falta você. Eu vejo o meu corpo tremer cada vez q chego em casa e olho o vazio que se estende pelos tantos cantos da casa. Ms t juro que tentei fazer d tudo. E tu vai assim, sem mais nem menos. Eu te segurei firme, te envolvi nos meus braços, e tu conseguiu escapulir. Eu to firme ainda Pai, to engolindo meu choro, retendo minhas lágrimas, enxugando o rosto de todos. Eu to firme Pai. Está tudo bem, pai, eu só estou sangrando. Gracias.

quarta-feira, 26 de março de 2008

O ingênuo perspicaz, o poeta Pedro.

Por: Gilberto Bernardi Junior

          Algumas pessoas parecem ter um espírito ousado sempre. Apresentam-se de forma, no mínio, interessante. Se olharmos ao nosso redor poderemos observar a presença de diferentes tribos. Tem gente de todo o estilo. Reggae, alternativo, punk, literário, conservador, naturalista, minimalista, enfim... Tem gente que só de olhar da pra arregalar os olhos e fazer com que eles saltem da cabeça, fazendo explodir o nosso imaginário.
          Então salve, salve por que nesta reportagem vamos contar a história de uma dessas pessoas. Ele trocou o endereço fixo por uma vida de andarilho, dando passos pelo mundo a fora, não tendo paradeiro nunca. O cara aprecia as letras, forma frases para encher a barriga, enaltecer a alma e engrandecer o ego.



          Nascido em Porto Alegre, residente em um Passat ano 80, Pedro Marodin tem 43 anos e a 19 é poeta. Um deslumbrado pela vida que largou a faculdade de Agronomia na UFRGS para levar uma vida totalmente sem, digamos que, rumo. Apaixonado pelo que faz, Pedro ganha a vida escrevendo poesias. É um militante nessa área. Se define com um guerreiro na arte de viver, pois o dinheiro que recheia seu bolso é apenas o da venda de seus livros.
          Numa aula de matemática, ao invés de somar, diminuir, dividir estava fazendo um poema. Quando todos já se retiravam, colegas e professor, o rapaz ainda sentado na classe, sozinho, terminava os versos. Ao final deles lagrimas começaram a cair de seus olhos e o choro compulsivo tomou conta de seu corpo. Nesse momento Deus dava o diploma de poeta a Pedro, nascendo o destino do ex-agronomo para o mundo da fantasia.
          Devido ao tempo em que tem em meio aos seus dedos um lápis ou caneta para colocar no papel, versos, Marodin já não lembra mais qual foi o primeiro poema que escreveu, porém, em entrevista comenta que, quando jovem fazia parte de um grupo de adolescentes da Paróquia São Sebastião e tentava catequizar uns amigos maconheiros que freqüentavam as salas de aula daquele lugar. Quando emprestou uma Bíblia a esses meninos, em troca, um livro do Mário Quintana “ Esconderijos do tempo” se pôs em suas mãos, levando ao seu intelecto o primeiro livro de poesias lido por ele.
          De cabelos longos e sotaque cantado, o nômade gaúcho não se restringe apenas ao Rio Grande do Sul. Se viajar é bom, imagina marcar as estradas do nosso país com versos e prosas. Canções e estrofes. Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás já conhecem um pouco desse “magrão” que usa nariz de palhaço e aos finais da tarde declama poesia para as crianças.


Quando a gente menos espera...

          Quando conheci o Pedro ainda estudava na cidade de Erechim, no Instituto Anglicano Barão do Rio Branco. Estava no primeiro ano do ensino médio. Na sala fechada, de 45 alunos, o vento gelado entrava por debaixo da porta quando, na aula de química, entra um senhor engraçado pela porta junto com o ar congelante do inverno tocando saxofone e em seguida declamando poesias. Eu sentava na última classe, bem no fundão. Com dez minutos de apresentação os nossos ouvidos ficaram quentes e nossas mãos duras, amoleciam com emoção daquele formador de versos.
          Alguns anos se passaram e logo ali, quando a gente menos espera, se da de cara com alguém caminhando nos corredores da Jornada Nacional de Literatura, em Passo Fundo. Desta vez eu estava na posição de estagiário voluntário do documentário do evento. Eis que encontro um homem de pochete na cintura, calça jeans e casaco. Ainda de cabelos alongados e livros nas mãos. Aproximei-me e perguntei se ele não era escritor ou poeta. Se já tinhas ido para Erechim e tal. O papo, num segundo surgiu, após eu comentar que o tinha conhecido na escola. Bradou Pedro, nos corredores de frio intenso da jornada. Era inverno também “Bá, tu tava lá? Eu toquei sax na tua aula, lembra!?”. Realmente o mundo é gigante, mas nos passa uma impressão de pequenino às vezes.


As estórias de uma vida, singular, prosseguem. Poesias e pneus...

          Se não bastasse se apaixonar por uma francesa no Fórum Social Mundial de Porto Alegre e como conseqüência vender o carro, uma Quantun 86, de nome Manoel, para ir até a França em busca desse amor, Pedro tem uma relação de afetividade com seus carros, que coloca inveja em qualquer pai coruja no paredão do big brother. “Eu tenho uma relação de parceria total, como eu não tenho ninguém pra conversar, na estrada, eu converso com eles. Falo dos amores, meus problemas, dívidas com a gráfica. Divido as alegrias, as tristezas...”. Nos conta o viajante.
          Atualmente o poeta das estradas está com um Passat de ano 80 que se chama Chocolate. Neste veículo, que acredito ser abastecido não apenas por gasolina, e sim, por muito alto astral, existe ainda o banco do motorista, já que o do caroneiro e o traseiro foi tirado para dar lugar a uma porta serrada na medida, por Marodin, que serve como uma cama, um colchonete e cobertores fazem o papel de colchão. É, viver de encanto pode dar dor nas costas.
          O homem nômade também tem suas ambições. Por de trás do perfil alternativo, improvisador, elegante, existe uma pessoa que busca melhorar a sua casa ambulante. Não vai pensar que ele vai compra um iate e começar a vender seus livros pelos sete mares, se bem que desse poeta... Enfim, segundo ele, um Motor-home seria o ideal para furar as transversais dos estados e insistir na venda de suas idéias num país que não tem como costume a leitura. Dentro de suas possibilidades financeiras, uma Kombi está de bom tamanho e as coisas teriam o seu devido lugar já que - “No Chocolate, na primeira curva, a cozinha se atira, se mistura com o guarda roupa, os livros se jogam no meio dos meus pés, o violão se joga no vidro, imagina o transtorno de ter uma tripulação louca e, pior, suicida, tão doida quanto eu”. Brinca o escritor.
          Talvez depois dessa reportagem a gente consiga, com muito esforço, mudar o conceito da cidade projetada, Brasília. Certo dia o poeta resolve ir para a capital do Brasil. Lá chegando suas idéias giravam em torno do preconceito em relação à corrupção, politicagem, mas o surpreendente tomou conta do raciocínio do malabarista de palavras devido à forma como o povo o recebeu por aquelas bandas. Segundo Pedro, uma vez o proprietário de um restaurante, seu Jorge, pegou ele pelo braço e sem conhecer seus dotes, fez os músicos pararem de tocar e o apresentou ao microfone local. Durante dez minutos, os poemas tomaram os ouvidos das pessoas do recinto que interromperam a janta para apreciar o espetáculo de versos. “Depois, ele me obrigou a sentar numa mesa e mandou eu me servir à vontade lá no fogão à lenha, nóóóssa, nunca comi um Tutu Mineiro tão gostoso”. Explica. Após o acontecido, para Pedro Brasília está incluída em seu coração como uma das cidades de maior valor sentimental.


“Capital da Literatura não é ter um livro ou um grande evento embaixo do braço”.

          De fato, às proporções que tomaram a Jornada Nacional de Literatura são gigantescas. Pedro é um cara rotativo, que não está sempre na mídia e seu rosto não estampa nenhuma tela ou capa de jornal, porém o seu espírito é revestido por uma experiência admirável, em suas retas, curvas perfeitas que colocam a sua opinião concreta sobre determinados pontos de vista. Um poeta que não se restringe apenas ao extremo sul e por isso pode, através da escola da vida, ilustrar as bordas de qualquer programação literária.
          Em entrevista pedi para Pedro o que ele achava de Passo Fundo em relação ao slogan “Capital Nacional de Literatura”. Pelo e-mail, o sonhador fantástico ressalta que o sofrido trabalho que a professora e coordenadora do evento faz, Tânia Ressing, é maravilhoso. Porém discorda que Passo Fundo seja a Capital Nacional da Literatura. “Capital da Literatura não é ter um livro ou um grande evento embaixo do braço, é ver o resultado humano que traz, na vida das pessoas e no seu cotidiano, anos e anos de leituras e amor à cultura e à arte”. Esclarece.
          A cidade brasileira que Marodin mais vende livros é Pelotas, e para ele esta deveria ter o título que Passo Fundo carrega. “Em Pelotas os pais incentivam os filhos desde pequenos a ler, quando adultos, continuam com a rotina do livro, sendo assim, não precisam de jornadas ou estímulo que venha do poder público”. Comenta o poeta. Ele volta o olhar não apenas para Pelotas no sentido leitura, mas também para os costumes desse povo, como: a educação na cidade; o respeito dos homens com as mulheres; com a arquitetura antiga. “Vai a Pelotas, tchê, vê a coisa lá e depois compara com Passo Fundo”. Indaga o Porto Alegrensse.
          “Passo Fundo tá mudando, pra melhor, mas questão de história ou de cultura, Passo Fundo ainda tem um grande passo a dar pra chegar na excelência dos pelotenses”...“Coisa boa tu ver uma cidade se tocando e almejando um bem maior que não apenas a cultura do arroz ou da soja, mas a cultura do afeto”. Finaliza com maestria o apaixonado por carros.


O ingênuo perspicaz... O poeta Pedro

          Ele vive da natureza, fotografando flores, olhando para o céu. Toca o profundo de todos com poesia. Atravessa quase que todo o país do samba cantarolando, formando, encantado a todos com um jeito despojado. O senhor do gigante plural. Das cores, sotaques. Pedro, o poeta que sola o asfalto com seu caminhar e interfere no tempo com suas linhas de experiência jovial.
          Um amante, que teve atitude ousada quando ainda era piá, 21. Um brasileiro de Porto Alegre que mora dentro de um carro, junto com seu violão, livros e idéias. Um solteirão casado com o horizonte. O torcedor gremista que adora quando o inter ganha, pois sua mãe de 83 anos fica com um sorriso que vai de orelha a orelha. O escritor poeta que se espelha em Quintana, Leminski e Baudelaire por terem uma linguagem fácil e simples, assim como é o bailarino Marodin.
          Ele afirma que a internet não vai superar o livro jamais, então aprecie o site www.pedromarodin.com.br. O camarada brincalhão. Um poeta de olhos esperançosos. Um ser humano realizado.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Anacronismo de um povo sem memória

Por: Gilberto Bernardi Junior


“Quero deixar as lagrimas de meus olhos escorrerem pelo meu rosto. Quando elas tocarem os meus lábios, a minha língua irá sentir o gosto amargo dos cordéis desta dança”.


          Decupar a nossa história. Não mudar. Esquecer os arredores. Acordar depois que o dia amanheça e se deitar antes que o sol se ofusque. Prisão. Calçar o inexistente e tropeçar nas calçadas esquizofrênicas da avenida ou paralelas. Andar. Parar em cada ponto cultural, desaconselhar o antigamente e não querer o globalizado. Ter um perfil quadrúpede, bisonho. Correr com destino à eternidade, mas deixar o vento marcar nosso semblante campinense com linhas profundas de cor preto e branco.
          A quadragésima oitava vela incendeia e, com a cera, derrete também a esperança. Os que glorificam hoje choram amanhã. Precisa-se de mais ceticismo e lógica. Discursos prontos e entusiasmo zero vão estar no altar da pátria nessa data sem prestígio. Então vamos deixar os adolescentes de lado mais uma vez e puxar quarenta e oito vezes a orelha dos motoristas desse complexo demográfico, formado no início do século XX. Mas dirigir embriagado, perante a lei, é crime.
          "Eu continuo a ser uma coisa só: um palhaço, o que me coloca em nível mais alto do que o de qualquer político”. Encenava Charles Chaplin. Eu quero ser um palhaço, fazer malabarismo, pintar meu nariz de vermelho, rir da boca pra fora e sentir meu coração campinense sangrar por ver novamente gente nova ser trocada, inalada e tachada de paralítica. Em Campinas do Sul santo de casa não faz milagre, só quando cospe no prato. Frágil fica o ego de cada profissional em formação, quando literalmente é deixada de lado, para dar lugar à desprezível politicagem. Isso dá arrepio, dá nojo, provoca cócegas. Nem parece que fazemos aniversário. 48 anos, viva!
          Ergam-se as lonas da esculhambação, que os rios já tomaram conta da cidade. O lodo emergiu e trouxe consigo toda a imundície subterrânea do riacho que atravessa a comuna. Depositam ali, nesse risco de água, graxa, gasolina e fezes. Não dá para esquecer dá celebre frase dita há uns meses atrás por um “cortês” daqui: “Eu tenho Campinas na palma da minha mão”. Sinta o cheiro da tirania no ar, e tente respirar para não dar desgosto a alma. Estamos de aniversário. Essa tonelada de prepotência, exercida por alguns membros do poder público, parece arder na pele do povo. Vota campinense, que em quase meio século te jogaram longe, te mandaram embora, não valorizaram o teu suor, não te deram valor algum, mas te pisaram no pescoço. Cante com os teus filhos, parabéns a você, menininha quarentona.
          Os teus olhos se fecham e não acreditam na prostituição. Veja as madrugadas, Campinas. As tuas filhas sendo profissionais do sexo por não terem opção de emprego. Não chore quarentona, isso é a realidade sendo jogada em sua retina. Nestes anos de vida, teus patrões abandonaram teus pais, filhos e filhas. Agora cidadezinha, agüenta, fostes tu que escreveste teu destino de tal forma e sem conteúdo. Carregue nas tuas costas a dor do abandono sentida todas as manhãs pelos teus adolescentes que ainda te fazem sorrir com dentes podres.
          E me expliquem, senhores dominantes, responsáveis por esse intenso abatimento progressivo: onde estão os empregos? E qual o motivo que leva tantas pessoas a não voltarem a aplaudir, e pisar em chão enviesado desse solo? 48 é superstição.
          As arquibancadas não estão prontas, a grama não está verde, a pista de atletismo é apenas poeira, o arco de traves já está enferrujado e a bola... A bola não existe! É assim que se encontra o estádio, com as obras estreantes na década de 90. E mais uma vez a pergunta: por que desistir do investimento na metade? Hoje, aquele espaço inutilizado pelo Estado é de serventia para usuários de drogas; para as profissionais do sexo ganharem seu sustento; para a geração saúde, em algumas tardes, caminhar em círculos na pista atlética. A poeira que se levanta faz o olho lacrimejar. Palmas incessantes para o nosso campinho de várzea. Agora vamos levantar em pé e com orgulho dar uma salva de palmas bem forte para o magnífico que teve a brilhante idéia de não dar continuidade ao projeto do estádio municipal.
          Estamos celebrando o que realmente? Um ano a mais de experiência? Se tivermos como experiência essa procissão de sombras durante todo esse tempo, imagina o que nos espera daqui uns anos. Ressuscitem os mortos, que os marinheiros estão abandonando o navio. Campinas é tarada em mandar seus queridos para um lugar longínquo.
          Criam-se ídolos boçais, conseqüentemente, a retribuição vem em forma de humilhação comunitária. Campinas conjuga o verbo fazer, de forma egocêntrica: em vez de conjugar na primeira pessoa do plural, NÓS fizemos, conjuga na primeira do singular, EU fiz. Um aniversário de quase cinqüenta velas, com quase sem jovens, sem empregos, com quase sem nada. Sem ritmo, sem poesia e sem cultura. E a burguesia sórdida sedenta de lucros. Lindinha Campinas fizeram do teu aniversário uma farsa. Você dançou 48 vezes, menininha quarentona.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Sem titulo por não ter nada.

Por: Gilberto Junior


          Baseado numa estória irreal. E-mail enviado a minha mãe em meu quarto nível de faculdade. A situação não era tão precária assim, mas precisava surpreendê-la para ganhar uns trocados a mais. Ao ler o e-mail ela me ligou rindo, pediu se eu não tinha vergonha na cara. Disse que não me ensinou a mentir, eu respondi: mãe estou estudando para ser jornalista.


Escrevo este pelo fato de não ter telefone disponível e barato, e também por fazer um tempo que não te mando um e-mail.
Minha mãe, adorável a tua persistência em estudar teus filhos, mas te digo em verdade que não da mais.
          Ser estudante - há teu ver seria, de fato, sofrimento, aos meus olhos está sofrido de mais. Não é por que Jesus morreu na cruz que terei que ser crucificado, Jesus já nasceu pecador. A ambigüidade da frase mantém o vício da religião católica mais sujo ainda.
          Mãe, já não da mais pra ficar estudando sem saber o futuro que teremos como jornalistas. Do jeito como vão as coisas, serei mais um cidadão escoado pelo mercado de trabalho.
          Mãe, já perdi a noção do saber e a distinção entre necessidade e futilidade. Não tenho nem uma cama para repousar. O guarda-roupa de 1970, já não agüenta mais de tanto guardar o tempo. Não escrevo apenas por uma cama no sentido dormir, e sim no sentido coluna do corpo humano, futuramente me causará muita dor na região lombar.
          Mãe, faço faculdade de jornalismo e preciso me alimentar de informações dos diversos tipos de mídias, no entanto, tenho apenas um aparelho de TV, sem antena, e que mal pega a manipuladora rede Globo de televisão. Como poderei formar opinião tendo apenas uma emissora que quase não da para assistir?
          Não sei mais se comer, na definição alimento, é necessário para o corpo. Há anos que apenas tomo café com pão. Atualmente, o pão é inexistente na mesa, mesa? Bom, a mesa é as minhas pernas. Mesa, pão, café, massa, feijão, arroz, saúde... Para estudante parece ser futilidade.
          Pra que usar as pernas? Meus pés calçam um sapato furado, número 38, em fase de decomposição. Eu calço 39. Futuramente gastarei quase todo o meu dinheiro num ortopedista por causo da coluna e da má saúde de meus pés. Estudar significa sofrer tanto assim?
          Mãe, higiene é fato consumado, seja no regime capitalista como no socialista. Trocar as cuecas uma vez por dia é manter um corpo saudável. Veja bem: a semana tem sete dias, porém, tenho apenas duas cuecas. Meu corpo fede.
          Ter uma boa aparência não é apenas vaidade, mas não tenho moedas suficientes para compra um aparelho de barbear. Não tenho 3,76 reais para comprar um Shampoo, muito menos um condicionador. Tomar banho, lavar o cabelo, escovar os dentes é futilidade, questão de higiene ou...?
          Manter a saúde dos pés também é interessante. Mãe, o que a senhora me diz a respeito das meias? Tenho apenas um par, o chulé é comida para meu estômago.
          Duas calças jeans. Duas camisetas. E eu ainda ajudo os mendigos que batem á minha janela. Eu vou para o céu? Ou ficarei vagando por ai com o canudo de jornalista na mão, sendo crucificado pelo povo, não pelo teor das palavras, mas pela aparência pisiquico-físico?
          Mãe, nesse momento você deve estar rindo da minha situação. Lembrando que no teu tempo de estudante, tomava você, chá com pão seco para manter a sanidade intacta. Desculpa, mas eu não vejo graça.
          Não vou escrever das outras coisas, como por exemplo, o meu fogão a gás de quatro bocas, que funciona apenas uma; ou da minha geladeira ano 1968, que tem preguiça de fazer gelo; ou do aparelho de rádio que não sintoniza freqüência alguma, muito menos toca cd. O sofá eu não vou comentar, pois já deves imaginar como a espuma se apresenta.
          Mãe, não da mais. Tenho fé e muita luta só que a realidade me faz desistir de continuar lutando pra se alguém na vida. E eu ainda tenho que escutar: deputados pedem reajuste no salário. Haja paciência, meu dentista não recebe desde outubro.
          Devido a esses fatos, descritos com um olhar sem se apegar aos detalhes, estou desistindo do meu curso a partir do ano que vem.
          Meus 63 kg me jogam a verdade em frente ao espelho. Os bolsos furados das minhas duas calças me indicam o futuro, e meu sapato furado me surpreende com a verdade do chão que piso. Pô, eu só tenho que ser um comunista. A desigualdade perante o mundo é vital. O sentimento de inferioridade coça a minha pele nua e crua. As chagas que cristo herdou ao ser crucificado, hoje estão em meu estomago em forma de gastrite.
          Desisto o semestre que vem pra quem sabe no amanhã, ter dois pares de sapatos, três calças jeans, dois pares de meia, sete cuecas e umas camisetas a mais. Talvez algum troco no bolso furado pra conseguir tomar uma coca média e um pastel de carne numa padaria de rodoviária.

Beijos mãe.
          Do teu filho indignado, pobre, realista, sem cama, sem fogão, sem cueca, sem meia, sem sapato, sem estágio, sem dinheiro, porém... Porém nada pô!

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Dedicatória

Por: Gilberto Junior

          A dedicatória abaixo foi feita no trabalho de conclusão do curso de jornalismo, monografia. De acordo com a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), todo trabalho científico necessita de agradecimento, dedicatória, desenvolvimento etc., etc., etc. Na UPF não seria diferente, folhas e mais folhas. Pode não haver um sentindo contínuo, mas para esta universidade, análise boa, é analise que tenha mais de 85 folhas, a minha deu 56. Duas de dedicatória, duas de agradecimento, três de resumo. Mais duas capas... E uma nota ótima. Para que fez uma monografia em seis noites, chego a teoria de que, quanto menos preocupação, melhor fica o trabalho.


          Algumas pessoas citadas, não vou definir o motivo pelo qual estão sendo descritas para manter a imagem do autor. Vamos nós:
          Dedico este trabalho único e exclusivamente a mim. Porém, seria agir de má fé não citar algumas pessoas, que sem elas, não seria possível o desenvolvimento desse estudo.
          A minha mãe e pai, por terem me colocado no mundo e conseqüentemente, hoje, poderem dizer que são pais de tão maravilhoso ser que sou, e claro, por darem todo o apoio e estrutura que uma pessoa necessita. Mas tenho certeza que me ofereceram muito mais além do que descrevo aqui, faltariam palavras.
          A Deus, por não me esquecer nos momentos em que mais precisava de um apoio emocional.
          A banda The Beatles por fazerem tão belas melodias, cujas me acompanharam no desenvolver dessa analise.
          A banda Mamonas Assassinas, sem comentários.
          Ao mundo capitalista, por conseguir implantar dentro da sociedade mundial, concepções lindas e maravilhosas como, por exemplo: ninguém precisa ser igual a ninguém.
          Ao meu mentor espiritual que, nos momentos de repouso, aparecia através dos sonhos para direcionar este trabalho.
          Aos filósofos por nos mostrarem que o pensamento se faz necessário em certos momentos de nossas vidas.
          Ao pensador Friedrich Wilhelm Nietzsche, por simplesmente dar aos seres humanos uma visão realista sobre diversos pontos de vista.
          Ao meu estado, por ser o maior de todos
          Ao meu país, por ter a felicidade de ter um clima tropical.
          Ao Spider-man e ao Capitão América, meus heróis de infância.
          Ao Chaves e Chapolin, pela astúcia implacável.
          Ao meu orientador, Otávio, pela paciência, entusiasmo, pelos puxões de orelha nos momentos necessários.
          Aos meus avôs, por serem providos de tão alta personalidade, que de seus corpos restam suas idéias.
          A todos os bares que me acolheram nos momentos em que a irritabilidade tomava conta dos pensamentos e assim, agiram como um harém, nos dando a certeza que a vida não é apenas trabalho e preocupações.
          Não posso esquecer do meu cachorro, ele adoraria brincar com estas folhas. Ele não parou de latir um minuto enquanto eu digitava estas páginas e o deixava de lado.
          E por ultimo, dedico esta monografia a sala e a caixa de papelão em que esta monografia ficará guardada por anos e mais anos até suas folhas ficarem amareladas e delicadas.

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Ela vestia branco e caminhava com uma balança...

Por Gilberto Junior

          Meia noite e um, iniciava mais um ano, 2007 chegava. Família feliz, desejos e saudações se repetiam de abraço em abraço. “Filho te desejo um 2007 cheio de amor, saúde, felicidade e muita grana” indagava meu pai, não só a mim, mas a todos familiares presentes na sala de comemoração. E lá sei ia mais uma garrafa de champanhe. “Só mais uma taça!” pedia o senhor do tempo.
          Enquanto todos bebiam o suco da sorte, avistei, através da janela da sala que dava para rua, uma amiga, corri para a porta da casa e fui cumprimentá-la. O afeto alegre se esbaldava pela calçada e, entre um pergunta e resposta, a boca dela a expressão “Estou fechada para balanço”. Logo me despedi desejando um feliz ano novo e voltei ao meu posto junto aos meus afins.
          Três horas da madrugada e a confissão fechada para balanço, insinuava os meus pensamentos mais sediciosos. As primeiras badaladas do ano me deixavam inquieto com o peso da balança. Com uma taça cheia de nada em mãos, lá estava à solidão do meu instinto para decifrar a demência da criatura.
          A mulher vestia branco, uma sandália prata, pele bronzeada e uma leve maquiagem. Seus olhos refletiam a alegria do princípio e sua boca expeliu a frase que coloca a tona o sentimento de falta de liberdade da pessoa. Toda pressão que os erros do passado exercem sobre a consciência, a senhora moderna deixou nas entrelinhas a embriaguez do espírito.
          Perguntas começam a se formar entre um cálice e outro: por que uma pessoa se fecha para balanço? Será que ela já viveu o necessário para colocar na balança todos os anos de sua vida? Ela errou tanto assim no ano passado? Será que a cada nova etapa a balança é usada? Por que alguém faria um balanço? Pra ver se deu lucro?
          As perguntas surgiam. As conclusões beiravam o inconsciente. Essa mulher, certamente estaria colocando em sua balança os prováveis não que obteve em 2006, por exemplo: o show que não foi; a roupa que não comprou, por que não tinha dinheiro; à noite que não riu por não ter gostado da piada; os amigos que não olhou; a decisão que não tomou e que mudaria sua vida; o sim que deixou de dar, e dois minutos depois se arrependeu; o pum que deu quando não devia; a caloria que comeu a mais... E outros tantos “não” que cometeu.
          Colocar na balança trezentos e sessenta e cinco dias, quando na verdade deveria continuar vivendo. Lógico, ela também vai inserir todos os “sim”, porém, o que mais vai marcar será o não - é do ser humano ter uma quedinha pelo sofrimento, se lembrar dos momentos falhos da vida.
  &
          Fazer um balanço de um pequeno espaço de tempo não se tira proveito algum. É preciso viver o agora, viver o segundo presente, o minuto passado já é se foi há sessenta segundos e não volta mais. Sentar num balanço até vá lá, o vento é bom, mas fazer balanço logo no iníco do ano equivale a um trote no meio da madrugada.
          Para que serve um balanço? Pra não cometer os mesmos erros? Quais erros? O erro de se apaixonar pela pessoa errada? Não escolhemos por quem nos apaixonarmos. Ou não errar novamente ao comprar ou não tal roupa? Tudo depende do bolso. Na verdade nessa vida não se faz balaço, todo varia com o ápice.
          A loirinha moderna vai pensar, balancear e cometer os mesmos equívocos de antes: comprar o que não tinha; tomar quando não podia; rir onde não devia, chorar por ter quebrado a unha e vai fazer o maior barraco; também vai beijar um cara quando não deveria ter beijado numa festa ridícula que não gostaria ter ido, mas foi.
          Fechado para balaço é uma filosofia fútil. O brasileiro vive em média 72 anos. Pra quem deseja fazer um pouco de tudo, essa sucessão de anos passa num piscar de olhos. Levando em conta que se dorme oito horas por dia e que começamos a estudar por volta dos sete anos e paramos lá pelos 30, cada milésimo de segundo deve ser degustado como vinho. Passamos a puberdade com medo dos pelos. Na adolescência, além das espinhas entramos na crise existencial. Quando adulto, nos preocupamos com o trabalho e as contas a pagar, e aí, o que sobra?
          Fechar para balanço seria um propósito sem causa, uma coisa esdrúxula. Do tipo rebelde mimado. Sinceramente, a moça loira de maquiagem leve, que vestia branco com sandálias prateadas, deixou naquela noite, sua sombra se molhar na chuva dos acontecimentos banais da vida.
          Que a moça de olhos pintados, pintura facial modesta, brilhante, sorriso meigo e transparente use o instrumento determinante relativo ao peso dos corpos quando estiver dando o último suspiro, após ter usado todo intervalo de tempo possível da vida. Mas que não passe de alguns segundos, pois os mesmos lábios que na virada do ano equilibraram o passado, farão do presente um ato honroso se não usar, ou souber usar a balança.

sábado, 29 de dezembro de 2007

A cisma da apreciação pela negatividade

Por: Gilberto Junior

“Vai existir um dia em que todos unir-se-ão para o bem comum – esse dia não existe”. Até que o povo, bobos da corte, defender o partidarismo, nunca vamos ser uma cidade decente. Não sei como uma cidade pequena consegue fazer transbordar tanta birra sem fundamento.


          Sim, eu gosto de falar, criticar. Mas também sei fazer um elogio quando merecido. E dói. Dói a minha intrínseca alma com as pessoas que agem de má fé. São esses seres desprezíveis que colocam a nossa cidade no calcanhar do mundo.
          Quinta-feira, 20, noite de calor agradável, cinco dias para o tão esperado natal. Eu estava no palco do centro de eventos de Campinas do Sul, apresentando o primeiro dia da semana natalina. Aproximadamente 500 pessoas presentes, apreciando os números artísticos que tomavam conta do tablado depois das 22h. A promoção era do Núcleo Cultural com apoio da Prefeitura Municipal e Câmara de Vereadores.
          Entre uma apresentação e outra, fazia comentários, lia frases natalinas, interagia com a platéia, enfim, descontraia o público até que o grupo chamado se colocasse na posição de ataque. Num desses comentários fiz um elogio a primeira dama, Rosangela Montepó e sua equipe de voluntários pela belíssima iniciativa de usar como enfeite natalino, reciclagem de lixo. Que sinceramente eu tiro o meu chapéu, me curvo diante de tão nobre atitude. Com todo o aviso que a mídia e instituições de ensino fazem sobre o aquecimento global e, toda a preocupação dos mais conscientes sobre esse fato, a reciclagem do lixo como decoração, tira de minhas mãos, aplausos.
          O que mais me chocou foi quando terminou as apresentações, inclusive a minha. Fui comprar uma água e, fiquei conversando com algumas pessoas. Após um tempo de bate papo me despedi do grupo e me coloquei em direção a minha casa, a pé, passo a passo caminhava lentamente, sem pressa. Na esquina entre a Rua Tiradentes e a Avenida Mauricio Cardoso, um senhor grisalho, de costume conservador se aproximou e bradou: “Giu, parabéns pela apresentação, mas como que tu vai parabenizar a primeira dama? Logo tu que escreve contra eles”. Olhei para este senhor e respondi que não tenho nada contra ninguém, só acho que as coisas precisam ser levadas mais a sério, e que o descompromisso geral com as coisas me coloca numa situação de indignação. E novamente o morador questiona: “mas dar os parabéns a eles?”. Olhei para seus olhos e respondi que não estou do lado de ninguém, de nenhum partido político, e que assim como as críticas são necessárias, os elogios também, independente de qual ideologia a pessoa que faz boas ou más ações, pertence. Falamos mais um pouco e cada um seguiu seu rumo.
          São pensamentos como esses que não deixam a nossa pequena cidade tomar proporções de maior expressividade. Como um povoado pode aviltar-se se o seu povo tem como princípio não acreditar no próprio potencial? O orgasmo de algumas pessoas de Campinas do Sul é assistir de camarote o erro alheio.
          Brilham as luzes natalinas, cintilam os olhos de nossas crianças ao passarem por esses raios luminosos. O encanto do velho, que aborda com suas renas na cidade de aproximadamente seis mil habitantes, termina, quando de seu saco de presentes uma aura de desilusão, espírito de porco e má índole saltam de sua sacola avermelhada e vão direto ao estômago de alguns cidadãos que, sem mastigar, cospem esta malvadeza para fora, atingido a todos com o mau hálito. Está proibido gabar.
          Um partidarismo nojento que não leva a nada. Seja de qualquer sigla, de qualquer crença partidária, a ementa de todos é linda, a prática - sórdida. Pior não é isso, a arte da política é necessária, ridículo são os integrantes das alas que contaminam o todo com pensamentos imundos. Vem dizer que não é uma bela iniciativa a reciclagem de lixo?
          Essas pessoas que se revelam contra as coisas boas que acontecem por aqui, poderiam usar como modelo os enfeites desse ano, para reciclar as próprias idéias, atitudes, vocabulário, intelecto e etc. Podem, também, usar a reciclagem para rever seus conceitos e não virar, no sentindo personalidade, mais lixo do que já são.



          Precisa de legenda?

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Quando as coisas dão certo dizemos "Graças a Deus". Quando elas dão errado dizemos "A culpa é do presidente."

Por: Wagner Pacheco


          O braseiro é grande mesmo. Eu puxo a brasa pra cá e você puxa pra lá, quanto mais brasa pra mim melhor... Coisas humanamente impossíveis de prever acabam tendo como pai Deus ou o presidente, como a última grande seca no Rio Grande do Sul e a queda do 3054 em São Paulo, neste meio tempo muita coisa boa aconteceu, Graças a Deus. A vinda da BSBios, do Cefet e da Italac pra Passo Fundo é a prova de que Deus está querendo o desenvolvimento do nosso município, em compensação o presidente não percebe o aumento da violência por aqui, nem o crescimento da cracolândia.
          Percebo a preocupação das igrejas em construir uma sociedade mais justa quando cobra o dízimo que, afinal, é a maior prova de fé e amor ao próximo e também quando perdoa os meus pecados. É, mas não dá pra comemorar muito porque a situação tá ruim pra quem precisa andar de ônibus na nossa cidade, pois, a passagem está muito cara e adivinha de quem é a culpa? Mas Graças a Deus, na vida tudo é passageiro e no domingo a banda de busão sai por um pila.
          Dizem que a fome se combate com agricultura forte, mas eu li que a publicidade é a mola propulsora da economia do país e que o jornalismo constrói cidadania mesmo quando se tira conclusões precipitadas, como já aconteceu em muitos casos. Me refiro a tortura constante em que os jornalistas submetem os familiares das vítimas do avião da TAM derrubado cruelmente pelo presidente Lula no dia 17 de julho do presente ano. Mas Graças a Deus entre as mais de 180 vítimas nem Daltro nem eu estávamos naquele Air Bus.


*Wagner Pacheco é acadêmico do VIII nível de Publicidade e Propaganda - UPF;
Diretor Acadêmico do Diretorio Carlos Gomes da Faculdade de Artes e Comunicação;
Secretário de Comunicação da União da Juventude Socialista (UJS);
Militante do PC do B

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Nunca acreditei muito em Papai Noel

O texto que segue é uma crônica do sempre crítico Arnaldo Jabour. Eu estva escrevendo uma sobre o natal, quando me deparei com este espírito natalino. Parei para pensar se deveria ou não postar esta crônica. Pensei mais um pouco e... Aí está o natal por Jabour.

Por: Arnaldo Jabour


"Natal, Natal - bimbalham os sinos!". Sempre tive vontade de começar um artigo assim. O Rubem Braga dizia que há certas frases que demitem jornalistas. Essa é uma.
          
O Natal me deixa vagamente abobalhado. A própria figura do Papai Noel me dá angústia. Eu acho que isso se deve ao hábito que meu pai cultivava de forjar uma carta que Papai Noel me enviava junto com os presentes. Na carta apócrifa, Papai Noel me repreendia pelo mau comportamento: "Não bata em sua irmãzinha, obedeça sua babá, não faça má-criações para sua mãe!..." Os presentes vinham com um gosto de castigo que me dói até hoje quando ouço o "Ho ho ho!" do bom velhinho. Papai Noel gostava de todo mundo, menos de mim; surgiu em minha vida como um "superego".
          
Talvez por isso, fui o primeiro da minha "gang" de nenéns do Rocha a desmistificar a figura do barbudinho. "Papai Noel não existe...!"– foi minha declaração revolucionária. Eu bradava a meus amiguinhos, que olhavam desconfiados para meu "ateísmo" natalino. "Existe sim!" – protestavam – "ele me deu o velocípede que eu pedi..."
          
"Ah, é?" – eu replicava, subversivo – "fica acordado esse ano para ver se não é o teu pai mesmo que finge que é Papai Noel e põe os presentes lá na árvore!..."
Meus amiguinhos lutavam contra essa desilusão, mais ou menos como hoje os velhos comunas não desistem do socialismo e vivem acusando o Lula de ter ficado "neo-liberal
          
Um outro trauma aconteceu em um Natal remoto, quando ganhei uma bicicletinha bem legal, mas que veio sem o "quadro", sem a barra de ferro que definia se a bicicleta era para homem ou para mulher. O "quadro", fálico, denotava bicicleta de homem; sem "quadro", era para moças. Falei: "Essa é de mulher..." "Mas, a bicicleta é para você, meu filho...Comprei sem "quadro" para você não se machucar, se cair..." Minha mãe estava cuidando de minha castração, pois eu poderia machucar meus pobres ovinhos na barra de ferro...Fiquei apavorado de desfilar nas ruas com "bicicleta de mulher". Que diriam os vagabundos mirins que assolavam as ruas do Rocha, se me vissem rodando nas rodinhas femininas? Claro que berrariam: “Viado! Viado!", - supremo xingamento da época, terrível pecha que poderia destruir a reputação de qualquer um de nós. "Viado" (e não "veado", por favor) tinha uma sombra de ambigüidade, um desequilíbrio que me assustava. Viado não era nem homem, nem mulher; "viado" era o mistério. Daí que nunca saí na rua com aquela máquina que selaria minha identidade em crise. Papai Noel me dava culpa e a bicicleta ameaçava a minha sexualidade. Por isso, creio, o fervor subversivo contra a festa magna da cristandade que atingia, de tabela, meus problemas com o pai real.
          "...
Nessa época, em pleno delírio nacionalista do Getulio no fim do Estado Novo, lançaram uma campanha para substituir a figura “imperialista” de Papai Noel por outro símbolo mais "coisas nossas". Inventaram uma figura tropical que nunca colou: o “Vovô Índio”, um velho semi-nu com uma peninha na cabeça, que traria presentes para os “curumins”. Foi um fracasso total, numa época em que o cinema americano alardeava o Bing Crosby cantando "White Christmas" sem parar. Tentei flagrar meu pai colocando os presentes no corredor longo e triste (por que o corredor era triste?), onde uma Santa Terezinha brilhava sozinha numa pequena peanha, mas nunca consegui. Recorri a meu avô, conselheiro e aliado, e ele me confirmou, de mãos dadas, me levando ao Jóquei Clube: "Isso é pra criancinha mesmo... Você já tem seis anos..."
A partir daí, eu não parei mais. Fui além. Entrei de sola na lenda da "cegonha" e do "bebê que o papai do céu mandou..." Meus amigos me olhavam em pânico, quando eu lhes tirava a inocência: "Vocês pensam o quê? A mãe de vocês ficam nuas e o pai de vocês bota uma coisa dentro da barriga dela pelo umbigo e, aí, vocês nascem..."           
Essa tese me valeu várias brigas de rua. "Minha mãe não, cara! Minha mãe é direita..." E tome porrada no meio fio, rolando no chão. Depois, fui partindo para religião e duvidas metafísicas sobre Deus, já maior, atazanando os padres do colégio: "Se Deus é bom, por que ele cria um sujeito que ele sabe que irá para o inferno quando morrer?" Nenhum padre me respondeu essa pergunta até hoje, mesmo falando em "livre arbítrio" etc.
          
Mas, a verdade é que eu nunca fui feliz no Natal. Lembro-me que, nas ceias, ficavam visíveis as frágeis ligações familiares, pálidas amizades entre primos e tios, um certo tédio constrangido depois dos presentes abertos, dissensões e antipatias adivinhadas em abraços frios. Eu olhava aquela família "viajando através do tempo", como um cortejo trôpego para um futuro baldio, eu via a solidão do primo insignificante, do tio fracassado, da tia maluca e muito pintada, dos avós já tristes e ausentes, eu via que, a cada ano, as festas ficavam mais ralas, o eterno presunto caramelado e o peru com apito ficavam mais sozinhos na mesa, os presentes mais baratos e nossa fragilidade mais clara. O destino das famílias é evidente no Natal. Os pobres ficam mais tristes com a dor do pouco que podem dar aos filhinhos e os ricos mais obstinados em provar a si mesmos que serão felizes a qualquer preço. A obrigação da felicidade me enlouquecia. Parentes que eu nunca via me abraçavam com uma forçada ternura, molhada por vinho e uísques misturados, terminando tudo naquela tristíssima saída na madrugada, com crianças chorando ou dormindo no colo, presentes carregados para os carros, berros de "feliz natal" nas calçadas. Por isso, só me resta o lugar-comum do início: "Natal, Natal – bimbalham os sinos!"...